“Aos gritos de ‘bicha’, perdemos por 0x0”

Flamengo sem Rodinei, Juan e Jorge, além dos longínquos desfalques de Ederson e Emerson Sheik. Santos sem Zeca, Thiago Maia, Lucas Lima, Gabigol e Ricardo Oliveira. Mando santista, jogo na Arena Pantanal. Era para o Mengo ter vencido.

Pelo contexto e domínio do jogo, não pelas chances criadas. Até os 45’ do segundo tempo, as melhores foram deles, com Rodrigão e Vitor Bueno, que mandou na trave. Também acertamos o poste, em chute de Mancuello. Ah, Mancuello…

Sabe-se lá por que deixado no banco por Zé Ricardo. Preferiu escalar Marcelo Cirino, que reinava para cima de Caju até se machucar. Chance de Mancuello? Não para Zé. Teimou no inexplicável Fernandinho, que – é verdade – fez um primeiro tempo acima do normal. No segundo, voltou a ser o Fernandinho que conhecemos. Posto pra jogar aberto pela direita, deu fim a quase todas as jogadas que passaram por ele. A razão é simples: só tem a perna canhota. Como ponta-direita, tinha de usar a destra. Não conseguia, puxava para a “boa” e acabava com as possíveis chances de gol rubro-negro.

Foram cerca de 430 bolas aéreas do Flamengo na área adversária. Nenhuma com perigo. Guerrero era bem marcado e não tínhamos mais ninguém para brigar entre os defensores santistas. Talvez enfim fosse a chance de o Mengo jogar com 2 centroavantes. De novo, não para Zé. Desta vez, ele foi de Mancuello. Saiu Fernandinho? Não, Alan Patrick!

Enquanto a dupla de zaga deles fazia grande partida, a nossa dava show de displicência. Difícil saber de onde Réver e Rafael Vaz tiraram tamanha confiança. Na cabeça dos 2, eram Domingos da Guia e Franz Beckenbauer defendendo a área rubro-negra. Lançamentos para o nada, investidas para armar contra-ataques e uma tranquilidade fora do comum na hora de sair jogando. Sorte flamenga que Lucas Lima, Ricardo Oliveira e Gabigol não estavam por ali. Réver ainda teve a ousadia de tentar 2 gols de bicicleta!

No meio-campo, Márcio “+10” Araújo cumpriu o acordo. Foi titular como consta no contrato. Errou os passes de sempre e ainda quase entregou o ouro em uma saída de bola. Segue sem sofrer ameaça de perder a posição para Cuéllar. Já Willian Arão fez bom primeiro tempo; de ruim para péssimo no segundo. Importante defensivamente, tomou uma série de decisões equivocadas na frente. Finalizou muito mal em contra-ataque e optou por um chute colocado absurdo no último lance da partida.

Muralha cumpriu bem seu papel, assim como Éverton e Mancuello. Não é possível que o argentino seja reserva. Deu mobilidade, ampliou o leque de alternativas e criou uma chance sozinho, mandando uma bomba na trave. Perdeu outra, parando na mão de um excelente Vanderlei, que sempre se agiganta diante do Flamengo.

Fosse a de Vanderlei a única mão na partida, estava ótimo. Até 2012, seria polêmico. Hoje não. A cada rodada, mais de um pênalti é marcado por lances similares ao de Caju, no último suspiro do jogo. Mais uma vez, não apontaram a cal a favor do Flamengo. É impressionante como precisamos de uns 5 toques de braço na área para que seja marcada uma penalidade a nosso favor, enquanto os outros times costumam necessitar de apenas uma.

Vale lembrar que antes, no 2° tempo, teve outra situação parecida, se não me engano com Victor Ferraz. Torcida e time pediram pênalti no lance, mas a transmissão da TV achou que a “polêmica” estava num suposto puxão em Guerrero, mostrando diversos replays do peruano e nenhum da bola no braço – ou braço na bola – do santista.

Zero pênaltis marcados, Arão isolou no final, e a peleja terminou em derrota rubro-negra. Sim, sem a Vila Belmiro e as principais estrelas, 0x0 em Cuiabá conta como vitória do Santos, e consequente derrota do Flamengo. Cenário ideal para que os grandes vilões fossem o homem do apito e Zé Ricardo – péssimo na escalação e nas alterações. Mas não foram.

Julio Fontes/Gazeta Press

vanderlei

A cada tiro de meta cobrado por Vanderlei, ouvia-se o coro de “bicha” das arquibancadas. Em 104 anos de futebol, a torcida do Flamengo jamais fizera isso. Aliás, o grito não constava na cultura brasileira até 2014. Com o surgimento das Arenas, ele apareceu. Torcedores “de Copa do Mundo” – que se mantiveram afastados de estádios nas últimas décadas – aprenderam com o “puto” dos mexicanos e resolveram inserir o hábito no futebol brasileiro, só que de maneira mais bárbara. A “moda” pegou principalmente em São Paulo, onde a elitização do esporte pós-Copa foi mais notória, mas se espalhou por demais cantos do Brasil.

Primeiramente, quem frequenta estádio desde sempre sabe que esse grito não existe. Foi introduzido por aqueles que antes passavam longe das arquibancadas, justamente para não se misturarem com o “povão”. Em segundo lugar – e mais importante – é uma manifestação preconceituosa, como seus propagadores.

Enquanto clubes brasileiros se estapeiam pelo rótulo de “time do povo”, o de maior torcida se posta longe da briga. O Flamengo não é o time do povo, é o time de todos. Somos maioria entre mulheres, homens, pobres, ricos, pretos, brancos, héteros e homossexuais. Gritar “bicha” vai além de perder a natureza humana. É deixar de pertencer à Nação Rubro-Negra.

Poderíamos ter dormido na vice-liderança, seguimos fora do G-4. Sob brados da homofobia, o Flamengo é incapaz de vencer.

Fonte: http://espnfc.espn.uol.com.br/flamengo/nosso-flamengo/10300-aos-gritos-de-bicha-perdemos-por-0x0

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