Arthur Muhlenberg: “As galinha pira”

O Brasil atravessa um período convulsionado e caótico, seus agentes políticos, que deveriam atuar para o fortalecimento das estruturas nacionais, em função de sua ilegitimidade, desonestidade ou despreparo, só contribuem para aumentar a instabilidade. O que era sólido se desmancha no ar, a bussola moral do país está de tal maneira doidona que até às 22 horas de sábado o líder do Campeonato Brasileiro era o Fluminense.

Foi quando então aconteceu o que as forças do atraso mais temiam, a vanguarda popular da Nação desafiou corajosamente os bloqueios do arbítrio e da desinformação para recolocar o Flamengo oficialmente na liderança que moralmente já ocupava. Um espasmo de alívio cívico foi compartilhado em todo o país pelas pessoas de bem vestir. Ao menos na esfera esportiva ainda prevalecia a justiça. Malfeitores, vivandeiras alvoroçadas e apologistas do quanto pior melhor se desesperam, porque sabem que não há para onde correr, já não há combustível suficiente para fugas, seja o destino Miami ou Cuba. Mengão é líder, porra! Atura ou sorta!

Para chegar à sua 4ª vitória no campeonato, talvez até irrelevante para a sua conclusão, visto que ainda estamos na 7ª rodada, mas épica em seu simbolismo, o Flamengo teve que enfrentar vários bichos-papões de uma mitologia criada artificialmente. Como a pretensa inexpugnabilidade do campinho do América mineiro, a sanha punitivista de juízes vaidosos ou incompetentes em busca de protagonismo imerecido e as levianas acusações sem provas de que o Flamengo sofrera uma mutação genética que alterara seu DNA vencedor pra caralho. Mas bastou que Everton Ribeiro mandasse pro filó a bola que lhe foi oferecida com açúcar por Vinicius Júnior, que a conduziu por metade do campo de jogo em velocidade de cruzeiro (sem ofensa), para que todas essas fake-news fossem descartadas na lata de lixo da história.

Que partida jogou o Flamengo. Não que tenha jogado bem, longe disso. Mas jogou com integridade, consciente de suas limitações e sem querer inventar a roda. Na torcida sempre vai haver quem exija que o Flamengo dê exibições de virtuosismo técnico e tático, mesmo sabendo que não temos roupa para esse tipo de evento. Mas a sua grande maioria tem mais o que fazer e só torce é pro Flamengo ganhar. Seja lá como for. Se o time vem pro jogo todo fudido, remendado e desfalcado em meio a uma maratona louca essa galera apoia, não fica procurando defeito.

E se alguma vez o Flamengo teve que jogar fudido, remendado e desfalcado foi ontem contra o monotitulado das Alterosas, titular na espera na fila imensa do Brasileiro há quase 50 anos. Mas foi um sufoco de louco. O Flamengo teve que escalar Thuler e Léo Duarte, que hierarquicamente falando era a zaga C. Mas como diz o guru Peter Drucker, mais importante que os organogramas é o autogerenciamento, e como jogaram os moleques. Sérios, focados, distribuíram bicudas, sai-foras e chegas-para-lá sempre na bola, sem violência e sem ficar de papinho com a arbitragem. E não estiveram sós.

Diego Alves, que tem a proteção de Sant Pau, o protetor catalão das balizas, foi testado ao máximo e não decepcionou, fechou a casinha, cumprindo rigorosamente com os termos de seu contrato de trabalho. Rodinei manteve a regularidade da direita, isto é, foi horroroso e ultrapassado, mas a atuação discreta e solidária de Renê no campo da esquerda manteve o bom nome da defesa. Que foi o setor que mais trabalhou durante um jogo em que a bola esteve em domínio do adversário a maior parte do tempo. O Flamengo tem que planejar com cuidado o futuro dos nossos jovens zagueiros, e premia-los. Agora o mais certo é pagar dois MacLanche Feliz e deixar que eles escolham os brinquedos.

Do meio pra frente houve menos brilho e inspiração. Mas não menos entrega e resiliência. Jonas é um altruísta e não se nega a entregar o pouco que tem, as fases de Paquetá e Diego não estão espetaculares, mas eles correram e aguentaram a pressão avícola sem perder a esportiva, apesar das constantes intervenções do Daronco, excessivamente preocupado com as aparências. Um juiz que tem o péssimo hábito de tomar decisões baseado mais em suas convicções do que nos fatos, se aventurando em terrenos que lhe são estranhos, tais como a medicina esportiva e a leitura de mentes. Um desastre.

Na frente, Everton Ribeiro, que já é sócio antigo do clube dos empaladores de galinha e Vinicius Junior, que muita gente esquece que só tem 17 anos e tem sido decisivo em todos os jogos, ganharam o bicho pro time todo, principalmente pro Dourado, de quem não se pode exigir muito enquanto o Flamengo pretender que ele seja o Guerrero. O cara veio pra fazer gol e pra isso ele tem que ficar lá dentro da área, e não distribuindo caneladas na intermediária, tentando fazer pivôs que nunca vão acontecer. É preciso cobrar esse remendo do Barbieri, que ele dê um tempo nos estudos e arrume tempo pra consertar isso.

Uma das características históricas do Flamengo é quando não dá na boa tem que ir na raça. A vitória veio porque o time soube aguentar a pressão, mas apenas uma couraça endurecida não será suficiente para as batalhas que tem pela frente. Há muito espaço para a melhora e é fundamental que as estrelas da companhia voltem a jogar no nível que se espera e que já mostraram que são capazes. Não somos a sensação a campeonato, mas já somos o time de que todos querem tirar uma casquinha. Pois que tirem casquinhas das suas próprias feridas. Das nossas perebas só nós que podemos tratar.

Mas enquanto isso não acontece estamos autorizados a comemorar, comedidamente, a liderança no Brasileiro. Não porque somos os melhores ou nos contentamos com a dieta dos cavalos paraguaios, mas porque é melhor ser alegre do que ser triste. E ainda está pra nascer a vitória do Flamengo que não mereça ser celebrada. Parabéns pro time todo por mais uma vez ter mandado as cocotas pra casa com aquele gosto amargo na boca, decepcionadas com o desfecho trágico e previsível do encontro malsucedido com seu rival platônico. E que elas não chorem tudo agora, que guardem um pouco pro returno, no Maraca vai ter mais.

Mengão Sempre

Reprodução: República Paz e Amor

Fonte: http://colunadoflamengo.com/2018/05/arthur-muhlenberg-as-galinha-pira/

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