“E Siemsen, Nobre e Bandeira saltaram juntos para o fundo do balde”

Ele voltou. Tem sido a marca de nossa desgraça futebolística. Uma tatuagem de cadeia, que escancara ao mundo a deturpação genética de nosso mais querido esporte. Lá vem o asterisco, esse sinal gráfico que arranca nossos olhos da prosa que interessa para mergulhá-los em letrinhas ininteligíveis de rodapé de tabela. “Não conseguimos explicar aqui, joguemos lá pra baixo”. Desculpe a grosseria, amigo, mas o asterisco é o fiofó da língua. Inclusive, se parece com ele.

Eis que o Campeonato Brasileiro de 2016 ganha seu primeiro asterisco. É o cúmulo do fim da picada. Um torneio que trouxe cores diferentes ao topo da tabela – o verde e o rubro-negro, que na Gávea são uma cor só -, tão belamente disputado e indefinido, patinará nos próximos dias no piso áspero do Tapetão, repleto de ácaros de gravata. Há três pontos em suspenso.

Nestes últimos dias, vimos quão infelizes podem ser cartolas, mesmo aqueles que acreditamos representarem algo novo, como os presidentes Peter Siemsen, do Fluminense, Eduardo Bandeira, do Flamengo, e Paulo Nobre, do Palmeiras (e eu ainda creio que são muito melhores que a média). Os três eram belos caranguejos prestes a sair do balde, mas se deram as mãos e saltaram juntos de novo para o fundo. Os de baixo riram e lhes deram as boas-vindas.

Dado o histórico de bastidores do Fluminense, como seria lindo se o clube restringisse sua revolta pelo ocorrido no Fla-Flu a um protesto em relação à interferência de agentes externos (no caso, seria o inspetor Sérgio Santos) na arbitragem do jogo. O juridiquês pode nos enrolar com retóricas mil, mas o fato é que, moralmente, o Flu despenca quando pleiteia a anulação de um jogo por conta de um lance em que a arbitragem, no fim das contas, acertou. Nos asteriscos dos códigos, pode-se desencavar mil argumentos. Nenhum, no entanto, encontrará o bom senso.

Do lado palmeirense, a entrevista coletiva de Paulo Nobre, ancorado por seu homem-forte do futebol Alexandre Mattos, foi um festival de ilações e insinuações. Sem coragem para citar nomes nem clubes, a dupla jogou ao vento que haveria uma conspiração para dar o título brasileiro ao Flamengo em detrimento do Palmeiras, e a prova cabal seria a lambança capitaneada por Sandro Meira Ricci no clássico carioca. Mattos, também sem citar nomes, disse que recebeu telefonemas de dirigentes de clubes que vão enfrentar o Flamengo no campeonato e que estariam temerosos de “armações”. Gritos, chiliques, pitis.

Do lado rubro-negro, Eduardo Bandeira tentou manter a elegância quando foi confrontado com as declarações de Siemsen, Nobre e Mattos após o Fla-Flu, ao vivo na ESPN, mas também elevou o tom. Coube a seu vice de Comunicação, Antonio Tabet, um ator, roteirista e humorista brilhante, cuja entrada no futebol deve ser celebrada, dada sua capacidade de oxigenar as ideias por onde passa, baixar o nível ao desferir ataques pessoais, “veladamente”, ao presidente palestrino. “Criança mimada e acostumada a ser dona da bola normalmente cresce com problemas de caráter. #PaiRicoFilhoNobreNetoPobre”, escreveu Tabet.

Menosprezando a inteligência alheia, nem Tabet nem Bandeira assumiram que o tuíte se referia ao presidente-mecenas Paulo Nobre, mas quem acredita que o vice não está falando de Nobre, acredita em qualquer coisa.

Clubes são nações, e presidentes são estadistas. Precisam se comportar como tais. Em vez de lançarem acusações a rodo, deveriam estar discutindo maneiras de melhorar as arbitragens, preparar adequadamente juízes e auxiliares para que os erros sejam minimizados. O futebol é uma engrenagem onde os clubes são interdependentes. Quando os presidentes colocam em dúvida a lisura do torneio, sem apresentar provas cabais, atiram para todos os lados, mas a única coisa que conseguem acertar são os próprios pés.

Fonte: ESPN

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