Os finalistas da Libertadores se aproximam num ponto: são os donos das maiores receitas do Brasil, clubes que passaram por processos de reestruturação e hoje colhem frutos com poderio econômico e esportivo. No entanto, as semelhanças param aí.

O Palmeiras iniciou sua reestruturação a partir do mecenato de um ex-presidente e, mais recentemente, turbinado pelo dinheiro de uma patrocinadora que, ao que tudo indica, será também presidente do clube, com todo conflito de interesse aí embutido, mas também permitido num país com pouca regulação. Mas o clube soube aproveitar o fluxo de investimentos para se organizar e caminhar com as próprias pernas, com receitas orgânicas.

Como foi orgânico, aliás, o saneamento do Flamengo, que pagou o preço de uma travessia no deserto, de temporadas de vacas magras. Ainda assim, o fez amparado por importantes contratos de patrocínio e cotas de TV maiores do que as dos rivais, permitindo manter um padrão mínimo competitivo e reduzindo riscos. Os finalistas enviam ao futebol brasileiro a mensagem de que gestões eficazes e responsáveis são o caminho mais confiável para o sucesso consistente, e não eventual.

Em campo, estarão times e técnicos que não poderiam ser mais diferentes. Se o futebol permite diversas formas de controlar jogos, o Palmeiras de Abel Ferreira é obsessivo por um controle que tem como pilar o domínio dos espaços, a negação deles ao adversário, e não um controle a partir da posse. Esta já foi prioridade do Flamengo, mas não é mais. Quando seus homens de frente se juntam e trocam passes em combinações rápidas, produzem lances que aproximam o futebol de uma forma de arte. Mas entre uma jogada e outra, é um time que desafia a compreensão.

O Flamengo poderia ser olhado como um time multifacetado, por vezes dono da bola, em outras dedicado a marcar atrás e acelerar no espaço. Mas o que parece versatilidade em muitos jogos lembra descontrole, desconforto de um time que sofre mais do que indicaria a diferença técnica entre seu elenco e os de boa parte dos rivais. Nos 180 minutos diante do Barcelona de Guayaquil, cedeu 30 finalizações. Não parece um time dedicado a exercer qualquer tipo de controle, uma espécie de ponto de encontro entre a beleza e o caos. Dá a sensação de não ser quem dita o ritmo dos jogos, mas um passageiro dos acontecimentos. Mas ainda assim, vence e produz lances de rara beleza.

Abel Ferreira exalta sua formação acadêmica e seus times traduzem uma rigidez tática. Renato chegou a desdenhar do estudo e seus times são a imagem da busca pela fluidez, por uma liberdade de movimentação que os talentos rubro-negros parecem ter abraçado. E do lado do Flamengo estarão os melhores jogadores do duelo, o que não é pouco.

Se o Flamengo tem comportamentos que variam, o contexto do confronto dá motivos para o Palmeiras de Abel ser ainda mais fiel à sua identidade: defender atrás, negar o espaço ao Flamengo, e buscar rotas de contra-ataque contra um time que tem imensas virtudes técnicas convivendo com problemas estruturais. Em futebol, os dois meses que nos separam da decisão são uma eternidade. Mas é provável que a final nos ofereça um duelo de estilos entre as duas potências do futebol brasileiro no momento: um encontro entre rigidez e fluidez num clássico que define uma era.