Flamengo x Racing foi muito mais que um duelo tático na semifinal da Libertadores: entre a mobilização do elenco, o apoio a torcedores feridos e medidas de segurança em solo argentino, o clube teve de agir em várias frentes na reta final para o jogo de 29/10/2025.
Na manhã que antecedeu a partida em Avellaneda, um ônibus com cerca de 40 torcedores do Flamengo capotou na Rodovia Presidente Dutra, no km 281, em Barra Mansa (RJ). A viagem, organizada por membros de torcida para acompanhar o jogo, terminou em socorro e muita apreensão: 32 pessoas sofreram ferimentos leves, 10 tiveram lesões de grau moderado e quatro foram classificadas em estado grave.
Um dos casos mais alarmantes envolveu um torcedor que correu risco real de amputação de três dedos da mão direita. Encaminhado à Santa Casa de Barra Mansa, ele passou por cirurgia de emergência; graças à rápida atuação da equipe médica, os dedos foram preservados e a amputação evitada. O clube chegou a providenciar, por precaução, uma prótese caso fosse necessário, mas a peça não precisou ser utilizada.
O Flamengo manteve contato direto com as autoridades locais para agilizar o atendimento: foi feito contato com a prefeitura de Barra Mansa, representada por Luiz Furlani, além de comunicação com a Polícia Rodoviária Federal e o Corpo de Bombeiros, que atuaram no resgate e no encaminhamento das vítimas ao hospital.
“Estava no ônibus, e ninguém percebeu o que aconteceu. De repente, o ônibus girou três vezes e foi aquela gritaria de desespero”
O depoimento acima, de um passageiro identificado pelas iniciais LP, mostra o pânico vivido pelos torcedores na hora do capotamento. Diversas pessoas relataram que a sensação foi de perda de controle total do veículo, seguida por correria e socorro improvisado até a chegada das equipes de emergência.
“Lembro que estava no ônibus e depois só lembro dos caras da Jovem me puxando para fora do ônibus. No hospital eu repetia as mesmas palavras: o que aconteceu? Fiquei em choque”
A torcedora Júlia Ciciliano contou que foi socorrida por integrantes de outra organizada que vinham em ônibus separado. O relato reforça que, entre o desespero e o atendimento, houve apoio mútuo entre torcedores na emergência do momento.
Testemunhas relataram ainda que o motorista reserva sofreu fratura exposta no braço. Há relatos de que o condutor que dirigia o veículo na hora do capotamento teria abandonado o local, informação que está sendo apurada pela organização responsável pelo fretamento. A torcida envolvida informou que vai investigar as condições do transporte contratado.
Atuação do Flamengo e suporte aos feridos
Diante da gravidade do incidente, a diretoria do Flamengo tomou providências imediatas para prestar suporte aos torcedores e às famílias. Além de monitorar o quadro clínico dos internados, o clube colocou-se à disposição para facilitar procedimentos médicos e comunicação entre os envolvidos.
O fornecimento preventivo de uma prótese e a mobilização de contatos locais demonstraram um acompanhamento ativo da diretoria frente a um cenário de alto risco. A viagem dos ocupantes daquele ônibus foi interrompida, e o clube seguiu acompanhando os desdobramentos enquanto a delegação se preparava para o confronto na Argentina.
Segurança em Avellaneda: hotel, controle de acesso e pedido contra foguetório
Em solo argentino, o Flamengo adotou medidas para resguardar a concentração antes do duelo. O elenco ficou hospedado em um resort na região de Hudson, em Berazategui, e solicitou reforço para evitar foguetório e atos de pirotecnia nas imediações — preocupação reforçada após episódios semelhantes em jogos anteriores contra outras equipes.
O hotel intensificou o controle de acesso: visitantes passaram a ser submetidos a checagem rigorosa de documentos e só tiveram entrada autorizada mediante liberação interna. Com apoio das forças locais, a intenção foi preservar o sono e a concentração dos jogadores na véspera da semifinal.
Além do controle de entradas, as autoridades locais adotaram postura de tolerância zero em relação a quem fosse flagrado com pirotecnia dentro do perímetro do resort, medida que ajudou a garantir uma noite sem perturbações ao grupo rubro-negro antes da partida.
Logística de retorno e proteção reforçada
O planejamento do retorno ao Rio de Janeiro também foi ajustado em função do contexto de segurança. O Flamengo definiu que a delegação retornaria ao país logo após o apito final e que o ônibus da equipe contaria com escolta policial reforçada ao desembarcar no Brasil.
Ao chegar ao Rio, o veículo seguiria sob proteção até um ponto na Barra da Tijuca onde haveria uma dispersão organizada: motoristas particulares estariam à espera para conduzir os atletas individualmente até suas residências. A medida visa reduzir a exposição dos jogadores nas vias públicas e mitigar riscos em trajetos a pé ou em veículos coletivos.
Essa escolha de logística não é isolada: foi tomada em resposta direta ao episódio envolvendo o goleiro Agustín Rossi, cujo carro foi atingido por disparos enquanto trafegava pela Linha Amarela após retornar em viagem com o clube. Rossi não se feriu fisicamente, mas o ataque elevou o nível de alerta sobre vulnerabilidades no deslocamento dos atletas.
Torcida em Avellaneda e a força da Nação
Em termos de presença, a Nação deixou claro que faria sua parte: os cerca de 4.000 ingressos destinados aos torcedores do Flamengo para o El Cilindro foram esgotados, mesmo diante de valores elevados. A massa rubro-negra ocupou o setor visitante, rodeada pela multidão do Racing, e marcou presença em Avellaneda com vigor e tradição de apoio fora de casa.
Foi organizado um ponto de encontro para os torcedores já na capital argentina: a concentração no cruzamento da Marta Lynch com a Avenida de los Italianos serviu para a ida conjunta ao estádio. A mobilização antecipada e o entrosamento entre torcedores mostraram mais uma vez a força da torcida em decisões continentais.
Do lado operativo, havia preocupação com o ambiente externo ao estádio, já que a festa local poderia transbordar para formas de pressão extra-campo — por isso, as medidas de segurança pedidas pela delegação também se refletiram em ações voltadas para garantir a integridade dos torcedores rubro-negros presentes.
Provocações, clima hostil e as declarações do treinador do Racing
O clima de confronto foi acirrado também por declarações do técnico adversário, que reverberaram entre os jogadores do Flamengo e elevaram o nível de atenção da comissão técnica. As palavras do treinador do Racing geraram incômodo no elenco rubro-negro, que encarou o episódio como mais um componente a ser gerenciado antes do jogo.
“Temos que vencer. Eu disse isso outro dia, eu disse a todos: ‘Vamos vencer este jogo de quarta-feira agora. Estamos lá desde o outro dia, tudo é positivo, tudo está lá. Tudo, tudo, tudo. \nEste jogo, mais do que nunca, precisa ser vencido de todos os ângulos. Não importa se nos multarem pesadamente. Isso a gente recupera depois. Eu não dou a mínima. Vamos dar o nosso melhor, o campo inteiro, tudo. \nAliás, peço a vocês, por favor: abram a porta na segunda-feira antes de irmos para o Hilton, para o Pilar. Deixem as pessoas verem, deixem que assistam um pouco ao treinamento, e encham a galera, sabe? Que venham aqueles que puderem. Eu disse a vocês: vão a Ferraresi e digam a todas as escolas para virem, tudo, tudo, tudo. Deixem as crianças verem isso, isso as emociona. E se elas estiverem comprometidas, ficarão ainda mais comprometidas. Esse jogo tem que ser vencido assim, né? \nA gente também tem que ficar de olho nos árbitros… mas enfim, vamos ver. Nós estamos indo embora, nós estamos indo embora. Eu tenho uma fé enorme, enorme, enorme. Nós vamos atropelá-los, nós vamos matá-los”
As falas acima contribuíram para um ambiente tenso que exigiu do Flamengo atenção tanto ao preparo tático quanto ao controle emocional do grupo. A comissão técnica teve de lidar com o foco interno e com as provocações externas, protegendo a concentração do elenco.
O que está em jogo e o caminho para a final
Dentro das quatro linhas, o Flamengo tinha a vantagem do empate após vencer por 1 a 0 no Maracanã, com gol de Daniel Carrascal. Essa vantagem colocava o clube a um passo de mais uma decisão continental e transformou a visita ao El Cilindro em um desafio de controle e administração de pressão.
Quem avançasse em Avellaneda enfrentaria o vencedor do confronto entre Palmeiras e LDU; os equatorianos chegaram com vantagem depois de um placar favorável no jogo de ida. Independentemente do cenário externo, a missão do Flamengo era manter a concentração, administrar o desgaste emocional e buscar a vaga na final marcada para 29 de novembro, em Lima.
Ao fim da jornada, a esperança rubro-negra era dupla: que a equipe confirmasse em campo sua condição de favorita e que os torcedores feridos no acidente na Dutra se recuperassem plenamente. A diretoria seguiu acompanhando as investigações sobre as condições do fretamento do ônibus e o acompanhamento médico das vítimas, enquanto a Nação permanecia unida na expectativa pelo desfecho esportivo.