O sorriso de campeão do NBB não sai do rosto, mas Gustavo De Conti também tem outros motivos para comemorar. Três dias após erguer o troféu com o Paulistano, o treinador, contratado pelo Flamengo na última segunda-feira, visitou a Gávea pela primeira vez. Vestiu o uniforme do clube, conheceu a história rubro-negra, tirou fotos ao lado dos troféus do Novo Basquete Brasil e de outras conquistas e ganhou de presente uma camisa oficial com o seu nome. Ciente do desafio que terá pela frente na equipe carioca, Gustavinho não se esquivou da pressão. "Inquieto", garantiu ter escolhido o Flamengo justamente por querer sempre vencer, revelou que o elenco da temporada vai mesclar experiência e juventude, frisou que espera implementar o esquema de jogo do Paulistano no Rio de Janeiro e que o time será forte e capaz de brigar por todos os títulos.
"Estava bem ansioso para vir, colocar a camisa. Quando você chega, a ansiedade passoa, você fica meio dopado, no bom sentido. Com tanta história, tanta coisa que você pensa que sabe, mas aprende mais. Estou muito feliz de estar aqui, é uma honra para mim"
Gustavo pegou a ponte-aérea logo cedo e desembarcou na Gávea nervoso. Se disse tímido, mas logo a ansiedade passou. De cara vestiu a camisa do Flamengo. Subiu as escadas e deu de cara com a estátua de Zico. Em seguida, sócios-torcedores o presentearam com o uniforme com o seu nome e um boné. Dali, embarcou em uma viagem na FlaMemória. Lá dentro, pediu para tirar fotos com a camisa de Zico do Mundial de 1981, ao lado da foto do time campeão do mundo em 2014, e com as conquistas da Liga das Américas e do Mundial, pedindo que a foto mostrasse a camisa do ídolo Marcelinho Machado, que se aposentou ao final da temporada. Confira abaixo a entrevista completa com Gustavo De Conti.
GloboEsporte.com: Como está a sua cabeça para enfrentar um desafio tão grande e em um clube que chama tanta atenção como o Flamengo?
Gustavo De Conti: Independentemente de onde eu venho, do clube que faz parte da minha história, que é o Paulistano, se não fosse treinador do Flamengo, pisar aqui na Gávea, ver toda essa história, impressiona realmente. Estava bem ansioso para vir, colocar a camisa. Quando você chega, a ansiedade passoa, você fica meio dopado, no bom sentido. Com tanta história, tanta coisa que você pensa que sabe, mas aprende mais. Estou muito feliz de estar aqui, é uma honra para mim trabalhar em um clube e numa posição importante. Tanta história. Tantas conquistas.
Os três últimos anos da sua carreira foram muito bons. Duas finais, título Paulista, título do NBB, melhor técnico do NBB. Como você vê essa sua evolução e o que você traz disso para o Flamengo?
Era algo bem diferente. No Paulistano tínhamos um orçamento bem limitado, trabalhávamos com jovens. Foi muito bom para mim. Adquiri experiência trabalhando lá. Passei por todas as categorias de base. Na seleção também, antes de chegar ao adulto. Fui assistente técnico também por muito tempo, depois técnico. Não me colocaram lá como treinador. É importante você passar por todas as etapas em qualquer profissão. Coroou com um título que ninguém esperava. O Paulistano não era favorito em nenhuma das finais que a gente disputou, muito menos esse ano. Coroou com isso e o que aprendo é que em qualquer lugar que você estiver, com qualquer elenco, se você trabalhar firme, forte, honestamente, consegue ter resultado.
Você já jogou muito contra o Flamengo. Fez uma final contra o clube e perdeu. O que você pode aproveitar do clube, agora do seu lado?
O Flamengo dominou os últimos anos, tirando os dois últimos que não conseguiu o título. Sempre teve um elenco recheado de estrelas, muito bom. Um clube com uma estrutura muito boa. Sempre foi muito difícil jogar contra o Flamengo. Acho que é difícil destacar um jogador só, tem o Varejão, o Marquinhos, o Marcelinho. Todos que passaram foram muito vitoriosos. O Flamengo é muito forte como equipe.
Durante a carreira você se acostumou a trabalhar com jovens. No Flamengo, é normal a presença de jogadores consagrados. Você tem o Varejão e o Marquinhos de contrato renovado. Como você pensa em lidar no dia a dia?
Vamos fazer uma mistura. No momento que fui contratado a conversa foi essa. Para termos um olhar especial para as categorias de base. Me disseram que há muitos anos o Flamengo não revela um jogador. Essa é uma das ideias. Não é o objetivo principal, que é ganhar títulos, mas é um objetivo muito importante. É uma meta importante que temos. E trabalhar com jogadores consagrados, já trabalhei no Paulistano. Com jogadores que estiveram no exterior. Na seleção já tive contato com o Marquinhos, com o Anderson. Até facilita. São caras que já ganharam títulos, têm experiência internacional. Eles sabem o caminho para ganhar um título e ser um jogador bem sucedido.
O estilo de jogo do Paulistano, de transição rápida, de chutes de três pontos, bem veloz e difícil de segurar, chamou a atenção esse ano no NBB. Você pretende trazer essa forma de jogo para o Flamengo?
Acredito que o basquete que vem tendo mais resultado hoje em dia é o desse estilo. Mas é preciso ter as peças certas para jogar desse jeito. Não adianta querer jogar desse jeito com um time mais lento, pesado. Não tem como. A gente vai ver como vamos conseguir montar o elenco. Não está fácil, a concorrência está forte. Equipes do NBB investindo muito e contratando bem. Até com poder econômico maior que o nosso, eu acho, pelo que estou vendo no mercado. Vamos ver o que vamos contratar, as peças que vamos ter, e depois vamos ver a maneira que vamos jogar.
O mercado está agitado, inflacionado. Franca está investindo bastante. Salários altos. É cada vez mais difícil o NBB?
Com certeza. Mais equilibrado. Não só o NBB, pelo investimento, jogadores de qualidade, mas o basquete está muito assim. O esporte está assim. No futebol, vôlei, vê times que não eram favoritos e dão um salto. No basquete a parte física está muito imporante. De confiança do jogador. O poder econômico pode ser diferente, mas as vezes isso não se apresenta. Franca contratando bastante, Bauru, Flamengo também. Isso não quer dizer nada. Na prática, dentro da quadra, é o que vale. O Paulistano sendo campeão, vice, demonstra isso na prática.
Do elenco que o Flamengo tinha, com contratos vencendo, e o Paulistano, com jogadores que são da sua confiança. Com quem você gostaria de trabalhar se fosse possível?
Gostaria de contar com todos daqui. Sinceramente. Do Paulistano também. Mas infelizmente os jogadores se valorizam. Não dá. Seriam 20 jogadores (risos). Vamos ver as possibilidades financeiras do Flamengo e o desejo de cada jogador também. É um conjunto de fatores. Mas o Flamengo já tinha um elenco muito bom, o Paulistano também. Vamos ver as possibilidades de todos os jogadores, mas uma coisa eu tenho certeza. Vamos ter um time forte e que vai brigar pelos títulos de todos os campeonatos que vamos disputar.
O Flamengo sempre entra como favorito. E logo no início do trabalho você tem a Liga Sul-Americana, que é um objetivo do Flamengo para jogar a Liga das Américas. Como é ter essa pressão por resultados logo no começo do trabalho?
É bom. Porque vai muito ao encontro do que penso. Sou um cara que poderia ter ficado no Paulistano 40 anos sem ganhar um troféu, sem fazer muita coisa em termos de resultados que estava bom. Mas não sou um cara acomodado. Não tínhamos tanta pressão lá, de torcida, diretoria. Mas eu mesmo me pressionava. Nós nos pressionavávamos. Minha cabeça é assim. Vou encontrar coisas diferentes aqui. Mas vai ao encontro essa questão de querer ganhar. Essa pressão por ganhar. Eu me pressiono muito. Esse foi um dos motivos de eu ter saído do Paulistano e ter vindo para um clube que pensa da mesma forma que eu.
Você é carioca, não é? Tijucano. Pode explicar melhor?
Meu pai trabalhava em uma empresa e foi transferido para o Rio. Eu e minha irmã nascemos aqui. No Morro da Usina. No meu RG está escrito Engenho Novo. Eu morei aqui até os cinco anos. Depois meu pai voltou para São Paulo. E fui criado lá. Morei em Laranjeiras, na Tijuca. Eu não tenho lembrança do Maracanã, preciso perguntar a minha mãe. Mas me lembro de comer churros na Barra. Adorava. Tinha uns trailers e parávamos lá para comer churros. Adoro até hoje. E lembro de chegar em São Paulo e as professoras da escola perguntavam o meu nome e eu dizia Gustavo, puxando o S. Elas davam risada. Adoravam o sotaque. Me perguntavam toda hora. E eu repetia (risos). São poucas lembranças, mas bacanas.
O José Neto, anterior técnico do Flamengo, tem uma relação com você. São amigos. Vocês conversaram depois do seu acerto com o clube?
O Neto é um cara que é padrinho de casamento, meu irmão, trabalhamos muito tempo junto. Merece todas as glórias. Está aqui, com a história marcada no Flamengo. Tem os dois maiores títulos do clube, a Liga das Américas e o Mundial. Fora os Brasileiros. Merece muito o meu respeito, meu amigo ou não. Mas não conseguimos conversar muito. Foi tudo muito rápido. Da final a conversa com o Flamengo. O acerto. Nos falamos, mas muito curto. Agora vamos nos encontrar em uma viagem, por acaso para o mesmo lugar. E vamos poder conversar mais tempo. As famílias vão estar juntas.