Deixa sensações conflitantes a vitória do Flamengo por 2 a 1 sobre o Barcelona, em Guayaquil. Pode até soar estranho, porque afinal o rubro-negro precisou encontrar alternativas para superar um time inteiro de desfalques, sete deles conhecidos às vésperas do jogo por casos de Covid, e conseguiu uma vitória em circunstâncias desfavoráveis. Além disso, colocou-se em posição privilegiada no Grupo 1 da Libertadores.

Só que o jogo chegou a acenar com uma daquelas atuações que devolvem a paz a um time e um treinador sob questionamentos após os 5 a 0 de Quito. Até erros defensivos que têm pouco a ver com desfalques e muito com questões estruturais da equipe impedirem que a noite fosse tão tranquila quanto se anunciou. O Flamengo traz pontos e dúvidas na bagagem.

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Não é simples falar apenas de futebol após tantas idas e vindas que colocaram em dúvida o jogo. Uma vez conhecido o surto de Covid no elenco do Flamengo, todas as peças se moveram nos bastidores para que, de algum modo, a partida acontecesse. Mesmo numa cidade que viveu cenas traumáticas na pandemia, mesmo com autoridades locais — ou algumas delas — entendendo que não era adequado jogar. E mesmo com um dos times bem desfalcado. O futebol nestes tempos é um grande acordo com que, por ora, todos os atores envolvidos decidiram concordar: o futebol, a qualidade do jogo, nem sempre é a prioridade; joga-se a todo custo para salvar acordos comerciais.

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Neste cenário, Domènec Torrent deve ter imaginado que viveria uma rara ocasião em que sua escalação não seria contestada: afinal, jogou quem sobrou. Ainda assim, a escolha por Thuler na lateral direita gerou debates. Se os nomes que jogariam eram previsíveis, a dúvida era como o catalão os organizaria para suprir a falta de algumas características no time que lhe restou. As principais delas, a velocidade, a infiltração às costas da defesa rival dando opções de profundidade. Dome pôs Arão à frente da zaga, acompanhado por um Thiago Maia que por vezes se projetava como um meia. Da direita partia Everton Ribeiro e, da esquerda, Gerson, num posicionamento surpreendente, mas que funcionou. Já Arrascaeta jogava perto de Pedro, ora como segundo atacante, ora se movendo por trás do centroavante como um meia. Não havia disponível um ponta de drible, nem um lateral de ultrapassagem.

Pedro abriu o placar para o Flamengo em Guayaquil Foto: DOLORES OCHOA / AFP

O Flamengo driblou isso de duas formas na primeira etapa: aproximações para trocas de passes, permitindo que o time progredisse; e com o ótimo trabalho de Pedro como pivô, de costas para o gol, aparando a bola para que os meias chegassem de frente. Logo a movimentação de Arrascaeta do meio para a esquerda gerou uma combinação com Gerson e o passe para o gol de Pedro. Aos 25 minutos, já estava 2 a 0 graças ao lance de Pedro como pivô, achando Everton Ribeiro, que deu a Arrascaeta. Os dois gols e as chances perdidas retratavam um time com fluência e um Barcelona muito frágil defensivamente. O problema é que, mais adiante, o jogo provaria que o Flamengo também era inconfiável sem a bola.

A linha defensiva segue jogando distante do meio-campo, muito perto da área rubro-negra. Quando os equatorianos progrediam com a bola, espaços se abriam. E ontem, não havia altitude. O fim do primeiro tempo já sinalizara o problema. Mas o segundo, com um Flamengo cansado e sem peças de substituição no banco, o escancarou.

Logo aos dois minutos Martínez descontou e colocou o Flamengo num dilema. Sem pernas, o time não pressionava na frente. Mas ao marcar atrás, não tinha velocistas para o contra-ataque. Tampouco conseguia esfriar o jogo com a bola.

Pedro se machucou e Dome lançou Lincoln. Mais tarde trocou Thuler pelo jovem Ramon, passando Renê para a direita. Trocando passes, o Flamengo até teve chances de ampliar, mas houve sustos. Colmán perdeu grande chance quando Léo Pereira foi batido no alto. Nos acréscimos, Preciado chutou com perigo. O Flamengo criou mais e venceu com justiça. Mas segue com problemas a resolver, em especial sem a bola.