O público vai voltar aos estádios de futebol no Brasil. Já não é mais questão de se, pois temos o quando: quarta-feira, com Flamengo x Defensa y Justicia em Brasília. O problema agora passa a ser o como — e talvez já não haja mais tempo hábil para discuti-lo adequadamente.

Flamengo:jogo com público em Brasília pode afetar retorno de torcida aos estádios no país

A diretoria do Flamengo foi, desde o início da pandemia, contrária ao fechamento dos portões. Discutiu a possibilidade de reabri-los em vários momentos, com números mais ou menos altos de casos de contaminação e mortes (baixos, no Brasil, eles nunca foram, desde que chegaram ao pico). Pode-se acusá-la de negacionismo, insensibilidade, falta de compromisso comunitário, mas não de incoerência. Os dirigentes rubro-negros estiveram sempre atrás de uma brecha, jurídica ou administrativa. No âmbito estadual, conseguiu levar convidados ao Fla-Flu; no nacional, não teve o mesmo sucesso, mas foi generoso com a distribuição de vagas no setor de credenciados; no continental, finalmente viu a oportunidade se apresentar.

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A Conmebol, que também já tinha levado seus convidados à final da Libertadores, considerou bem-sucedida a experiência na decisão da Copa América, que teve aglomeração nos portões do Maracanã e até um teste de PCR falso apresentado por um argentino. As imagens de torcedores sem máscara, ignorando o distanciamento social e espalhando aerossóis pela arquibancada enquanto xingavam os adversários ou comemoravam o título, foram comparadas às da Euro — disputada em países em outro estágio do combate à pandemia, e mesmo assim levantando dúvidas entre os cientistas sobre o papel da competição no aumento do número de casos de Covid-19, especialmente os da variante Delta.

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Mas a ordem foi dada: abram-se os portões. Era apenas natural que o Flamengo fosse o primeiro candidato, mas outros virão. O governo federal, patrocinador da Copa América, é apoiador de primeira hora da iniciativa. Governadores e prefeitos ainda resistem, mas a pressão sobre eles será cada vez maior — um processo muito semelhante ao que levou à volta do futebol (sem público) depois das duas paralisações causadas pela pandemia. Brasília puxou a fila, com um protocolo que ficou pronto em questão de dias e teve um de seus principais itens, a obrigação de apresentar o comprovante de vacinação, derrubado imediatamente após a divulgação.

Protocolo foi a palavra mágica de quem quis a volta dos jogos, e será de novo para quem quer a volta do público. É, logicamente, importante — desde que seja discutido antes, observado com rigor durante e reavaliado constantemente depois de sua implementação. E no Fla-Flu do futebol brasileiro há pouca gente disposta a seguir as três etapas do processo. Desde o começo, estamos divididos entre os que não queriam que a bola estivesse rolando de jeito nenhum e os que sempre quiseram que ela rolasse, de qualquer jeito. Sobra pouca gente no meio.

A Conmebol deu seu sinal verde lá de Luque, e cada país que se vire para aceitá-lo. Por aqui, a CBF dizia que não via condições para jogos com público antes de setembro. Mas hoje não se sabe nem quem manda lá. O primeiro portão já abriu, e como se diz na minha terra, porteira que passa um boi passa uma boiada. E boiada que passa sem comando vira estouro.