“Nem parece jogador”: discreto e surpreendente, Marí encanta cariocas e se declara ao Flamengo

“Vai entrevistar o Pablo Marí? Ele é legal pra caramba! Nem parece jogador. Fala com todo mundo, dá atenção. Nota dez!”.

O relato de um dos funcionários do condomínio ajuda a entender quem é o espanhol que aceitou o desafio de cruzar o oceano para defender o Flamengo. Pablo Marí foi o reforço mais “inusitado” para 2019, mas não menos eficiente. Sereno e discreto dentro e fora de campo, o zagueiro venceu a desconfiança para fazer o caminho inverso do que é padrão no mundo da bola.

Pablo Marí sorridente em condomínio onde mora no Rio: queridinho dos funcionários — Foto: Cahê Mota / GloboEsporte.com

Simpático, com respostas bem fundamentadas e discreto, Marí “nem parece jogador”, como definiu o funcionário do condomínio. Talvez por isso desfrute tanto de cada momento da aventura sul-americana. Principalmente dos encontros com a torcida rubro-negra no Maracanã:

– Minha primeira memória é o Emelec em casa, quando viramos a eliminatória. Já passaram três meses e ainda não tenho palavras para descrever. Não vou ter nunca. Sentir isso lá de dentro é algo sem palavras.

O choque cultural é grande para o espanhol fã de Piqué, e vai muito além das quatro linhas. O idioma o defensor dribla bem: entende perfeitamente o português, mas prefere responder em espanhol para ser bem compreendido. Quanto aos hábitos, ainda tenta se adaptar. Mas de peito aberto, sem comparações ou reclamações.

Ver os microfones mudarem de rumo rapidamente na zona mista quando passa um jogador mais badalado, por exemplo, é algo de difícil compreensão, soa desrespeitoso. A passagem pelo Brasil, no entanto, é um mar mais de rosas do que turbulento.

Gol do Flamengo! Arrascaeta cruza bem e Pablo Marí desvia para marcar, aos 21′ do 2º tempo

Como o próprio zagueiro revelou certa vez: Jorge Jesus mudou sua carreira em poucos meses. E no pacote Flamengo, Rio de Janeiro, Brasil, Marí não tem dúvidas: fez a escolha certa.

– Tem sido uma mudança radical. Trocar a Espanha pelo Brasil não foi fácil. Estávamos muito bem em Coruña, uma cidade muito bonita, calma, a temporada tinha sido boa e estávamos tranquilos. Mas olhando para trás, faria o mesmo. São quatro meses e as coisas estão muito bem. Tenho a oportunidade de disputar dois títulos e isso é muito importante. Estou feliz no Brasil.

Em bate-papo no condomínio onde mora – aquele onde é o queridinho dos funcionários -, Pablo Marí passou a limpo o período no Brasil, falou sobre a relação com o Manchester City e comparou o futebol que encontrou aqui com o europeu.

Confira abaixo toda entrevista:

O desafio sul-americano

Antes de tudo, o projeto que o Flamengo apresentou era muito bom dentro do que eu tinha de opção na Espanha e na Inglaterra. Era importante também definir logo. A notícia chegou no sábado de noite e na terça tudo já estava certo. Foi um projeto que me trouxe muita esperança de crescer, de fazer história. E isso é importante.

Pablo Marí em visita ao Cristo Redentor: à vontade no Rio de Janeiro — Foto: Arquivo Pessoal

Quando cheguei, estávamos perdendo por 2 a 0 para o Emelec, a oito pontos do líder do Brasileirão, tínhamos acabado de ser eliminado na Copa… O momento não era como agora. Mas trabalhamos, trabalhamos, trabalhamos com esperança e vontade. Não conquistamos nada, mas estamos próximos.

Conhecimento do futebol brasileiro

Sempre se falava de três a quatro clubes importantes com jogadores que sempre saíam para Europa. Corinthians, São Paulo, Palmeiras, Flamengo… São equipes que sempre aparecem no exterior. E de uns anos para cá, o Flamengo é quem mais tem feito ruído. É um clube que foi me buscar na Europa e está sendo um prazer.

Futebol europeu x futebol brasileiro

Há diferenças bastante grandes. Primeiro, que é muito individual, é menos tático. Na Europa, o treinador dá mais importância ao efeito tático. Aqui, é mais anárquico. Obviamente, o jogador tem um grandíssimo talento, mas são futebolistas que buscam primeiro as ações individuais. É difícil encontrar equipes que pensem como equipe. Essa é uma grande diferença.

Marí com esposa e filho nos tempos de La Coruña — Foto: Reprodução Instagram

O ritmo da partida também é diferente. Aqui, é mais calmo, mais pausado, com uma posse de bola com mais calma. Na Espanha, tudo é muito mais rápido. Graças ao nosso treinador, temos conseguido as duas coisas no Flamengo: somos rigorosos taticamente e fazemos as transições muito rápidas. É uma ideia europeia e isso nos torna diferente dos demais.

Perspectiva antes do Flamengo

Estava falando com um clube da primeira divisão da Espanha e um par de equipes na Inglaterra. Eram possibilidades na mesa. Quando veio o Flamengo com seriedade na proposta, decidi seguir esse projeto grande.

Relação com o Manchester City

O grupo City tem quatro ou cinco equipes. Não aconteceu somente comigo. Foram muitos jogadores comprados com talento, geralmente jovens, que serviam a esses clubes. Não era o meu caso, eu já tinha 22 anos, e eles queriam de mim um defensor com experiência para ajudar essas equipes.

Marí em Manchester: nenhum jogo pelo City — Foto: Reprodução Instagram

Na Holanda, era um time recém-promovido (N.A.C. Breda) e que eles queriam se manter na Primeira Divisão. Então, precisavam de um zagueiro central experiente para ajudar nisso, tanto que com uma semana o treinador me deu a braçadeira de capitão. Foi lindo. Sofremos muito contra Ajax, PSV, equipes de um nível diferente. E conseguimos nos manter.

Jesus mudou sua vida?

Ele tira coisas de mim que nenhum treinador nunca conseguiu. Potencializa minhas coisas boas e corrige o que tenho de ruim. Tira minha melhor versão. O Mister consegue coisas que ninguém nunca foi capaz.

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Repercussão na Espanha

Ainda não sei. Estou somente há quatro meses e não sei mesmo qual repercussão há na Espanha. Espero que seja muita. É meu país e gostaria que soubessem que estou aqui disputando títulos. Tomara que faça muito ruído.

Ídolo

Sou de uma geração em que os zagueiros da Espanha foram muito importantes, conquistaram campeonatos e vão ser sempre referências: Sérgio Ramos, Puyol e Piqué. Eles são muito diferentes. Acho que sou mais parecido com Piqué pela altura, pelo trato com a bola. Os outros dois são distintos, muito rápidos. Puyol com menos contato com a bola, mas muito agressivo. Por isso, acho que pareço mais com Piqué.

Sergio Ramos e Piqué: ídolos de uma geração espanhola — Foto: Agência EFE

Peso da Libertadores na Europa

Não é uma competição tão local. Na Espanha, se fala muito da Libertadores, da final, das equipes que vencem… Falamos muito da final River x Boca. São jogos com torcidas muito grandes e que gostamos de ver.

Maracanã lotado

Minha primeira memória é o Emelec em casa, quando viramos a eliminatória. Já passaram três meses e ainda não tenho palavras para descrever. Não vou ter nunca. Sentir isso lá de dentro é algo sem palavras. Estou vivendo algo maravilhoso. É uma torcida que nos acompanha em todas as partidas, 70 mil em todo jogo em casa. É algo incrível.

Mosaico da torcida do Flamengo contra o Emelec: lembrança marcante — Foto: André Durão / GloboEsporte.com

É muito diferente. Na Holanda, os torcedores também cantam toda partida, mas na Espanha é diferente. No Maracanã, a diferença é que são 95 minutos nos apoiando, um jogador a mais, e que só querem que conquistemos coisas. E é algo que faremos por eles.

Vida no Brasil

É bastante diferente. Os horários, as comidas… É muito choque cultural. Mas quando é bom, você se acostuma. E estamos adorando viver aqui no Rio, em especial na Barra. Estamos muito à vontade e felizes. Tenho um filho e gostamos muito de passear, tomar um sorvete, passar tardes em família. Estou jogando para uma torcida muito grande. É natural que me parem na rua e não me incomoda nem um pouco tirar uma foto, dar essa alegria para o torcedor.

Idioma

Está sendo um pouco mais lento o processo. Já entendo muito o que os companheiros falam, o treinador também, me comunico em português. Não lembro um ou outra palavra, mas tudo bem.

Gosto muito da Marília Mendonça, que é muito tranquila, tem o som do Brasil e me ajuda e entender o idioma.

Jeito de ser

Vou ser sempre a mesma pessoa: humilde, trabalhadora e profissional. Foi assim na Holanda, no Depor, no Girona, aqui…

Fonte: https://globoesporte.globo.com/futebol/times/flamengo/noticia/nem-parece-jogador-discreto-e-surpreendente-mari-encanta-cariocas-e-se-declara-ao-flamengo.ghtml

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